sexta-feira, 28 de novembro de 2014

O que a comoção gerada pela ex-modelo viciada em crack revela sobre a sociedade brasileira



Esses dias fiquei sabendo da história de uma ex-modelo que foi encontrada morando nas ruas. A triste história foi revelada pela Veja São Paulo e logo em seguida divulgada por diversos portais. Logo, todas as emissoras queriam entrevistas com a moça, participação em programas, falam até em reality show com ela. A comoção espalhou-se e logo todos queriam ajudá-la a sair da difícil situação em que se encontra, largar o vício e quem sabe até retomar a carreira. 
Considero tudo isso muito válido, afinal muita gente precisa de ajuda e apoio pra conseguir sair de determinadas situações, especialmente essas nas quais o vício leva a viver em situações degradantes (sem fazer aqui juízo de valor acerca da legalização das drogas), o problema é: existem milhares de outras pessoas nessa situação e nenhuma emissora de TV quer fazer reality show com elas, nem mesmo tentar ajudar a sair do vício, sair das ruas e reconstruir a vida. Porque isso? Qual a diferença entre a modelo - que não coincidentemente é magra, loira, de olhos claros -
e as demais pessoas nessa situação? Por que esses outros estão lá há tanto tempo e ninguém se preocupa em tentar ajudá-los? Por que apenas essa moça chamou atenção? 
Obviamente essa moça merece toda a ajuda possível e necessária, mas o que quero deixar bem claro aqui é: e os outros? Será que eles não merecem a mesma atenção, a mesma comoção por parte da sociedade? 
O que fica muito claro é que as pessoas veem aquela mulher branca, loira, alta e pensam "ela não pertence a esse mundo, vamos tirá-la dali", mas as outras centenas de pessoas, negras na sua maioria, que estão nas ruas todos os dias, que também tinham uma vida - podia não ser uma vida glamourosa de modelo, mas ainda assim viviam, tinham emprego, talvez família constituída, amigos, sonhos, planos - mas aparentemente consideram normal que estejam ali, afinal são negros e pobres, eles sim pertencem a esse mundo, um mundo desumano, um mundo que está apartado do nosso, totalmente esquecido (propositalmente, diria). Isso só demonstra o quanto a nossa sociedade ainda é racista. 
Negros e pardos podem estar em situação de miséria extrema, tendo que praticar pequenos furtos, até mesmo assaltos, para sobreviver e sustentar o vício,  mas tudo bem, é assim mesmo. O Brasil inteiro conhece, ou pelo menos já ouviu falar, na cracolândia e das condições a que as pessoas estão passando, mas o descaso do governo e da sociedade parece estar de tal forma enraizado que é natural pensar naquelas pessoas e simplesmente dizer "estão assim pq querem", são "um bando de drogados", "bando de
vagabundos". Agora uma pessoa branca de olhos claros está lá e automaticamente todo mundo pensa "nossa, o que ela tá fazendo aí???". O nome disso, meusa migos, é racismo. Sim, racismo. A moça branca deve estar linda e feliz modelando e as milhares de negras e negros podem ficar ali por anos e anos e ninguém dar a menor importância? Por que será que o Rodrigo Faro nunca foi andar por lá pra ajudar qualquer uma daquelas pessoas? Por que uns merecem atenção e outros descaso? O racismo estrutural coloca que brancos são superiores e têm privilégios. O que ocorre nesse caso é exatamente isso: a moça que deveria ser privilegiada está no meio dos que não têm privilégio algum.

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