sexta-feira, 22 de abril de 2016

O machismo/misoginia nas críticas à presidenta

              Já fazia um tempo que eu vinha reparando em como as críticas que a nossa presidenta vem sofrendo são de cunho machista. E não me refiro apenas àquelas super diretas em que as pessoas a chamam de "puta", "vadia", "vagabunda", porque isso é claro. Estou falando do volume de críticas. O governo tá ruim? Tá péssimo. Deve ser criticado? Com certeza. Mas tenho a impressão - os mais velhos me corrijam - de que já estivemos em situações muito piores; níveis de desemprego ainda mais altos; inflação mais alta e etc mas nada dessa comoção toda. Nada de toda essa revolta. Nada de um clamor tão grande por impeachment, especialmente quando não se tem base para impeachment, ou seja, não existe crime de responsabilidade (e impedimento sem crime de responsabilidade é G-O-L-P-E).

                Se acontecia sempre e ninguém estava nem aí qual o problema agora? "A população ficou mais consciente", alguns podem dizer. Será mesmo? Pedir impeachment de uma das únicas não citadas na lava-jato e que não é investigada por corrupção nem nada? Concordamos que ela não foi a melhor gestora e que estamos numa baita crise econômica - que se agrava devido a instabilidade política - mas impeachment só se dá em caso de crime de responsabilidade, como já mencionado, e não por má gestão, incompetência e insatisfação popular. Friso: baixa popularidade não é motivo para impedimento. Há controvérsias sobre as pedaladas fiscais, se elas configuram mesmo esse ilícito e tal. Não vou me ater nesse ponto. O que importa aqui é: por que esse ódio? Respondo afirmando que esse ódio todo é porque Dilma é mulher. Mulher no poder incomoda. Mulher com o maior cargo do executivo de um país incomoda muito mais.

                  Na votação do dia 17/04/2016 ficou claro quem são nossos representantes: homens sexagenários, brancos, heterossexuais e ricos. Muito ricos. Estão lá para nos representar..ou deveriam vestar, já que defendem apenas seus próprios interesses - vide o conteúdo de suas falas nos votos favoráveis ao impeachment proferidos naquele dia. Pela mãe, pai, avô, filhos, netos...por último, "pelo Brasil". Muito sintomático. E foram esses que nós escolhemos pra estar lá (tá certo que nossos sistema para eleição dos deputados tem aquela parada de coeficiente partidário, eleitoral e etc, mas tivemos que votar em alguém pra que aqueles senhores fossem parar lá). A diversidade na câmara é mínima. Poucos negros, poucas mulheres (mulheres negras então nem se fala), poucos indígenas...ou seja: a casa que nos representa não representa a nossa diversidade. Por que então colocamos essas pessoas que não nos representam lá dentro? Ainda não se aceita mulheres, negros, homossexuais - e outros minorias - no poder. E quando uma mulher ousa chegar ao mais alto cargo do país...eles não deixam ficar por isso mesmo.

                  Ficou claro pra mim o teor machista de todas as críticas quando saiu uma matéria de capa da IstoÉ na qual aparecia uma foto de Dilma que aparenta estar gritando. Ou maluca. Ou qualquer coisa do tipo.  "As explosões nervosas da presidente", escreveram. Até chegaram a compará-la à "Maria, a louca". Por que isso é misoginia? Mulheres são tidas como loucas, histéricas - até  a origem da palavra histeria é misógina: doença que se originava no útero - . Quem leu a matéria viu que não há informações contundentes, não há sequer fontes confiáveis: tudo que é dito lá é puro preconceito de gênero, reforçando um velho e conhecido estereótipo das mulheres: o de que não racionalizamos. Quantas de vocês, mulheres, já passaram por isso quando são mais assertivas, quando não baixam a cabeça, não aceitam atitudes desrespeitosas? Certa vez um estagiáriO me disse que eu não estava "raciocinando direito" simplesmente porque não concordei com ele. Não se enganem, está tudo no mesmo pacote. Quantos políticos homens vocês já viram passar por isso?

               Não bastasse, a Veja fez uma matéria falando sobre Marcela Temer. Até aí tudo bem, o problema foi como a revista a mostrou: bela, recatada e do lar. Meus feeds do feisse, twitter, instagram, snapchat foram INUNDADOS de críticas - o que mostra que tenho as pessoas certas adicionadas. Amém. -  Não críticas à Marcela, mas sim críticas à reportagem nojenta da revista mais reaça do país..ou será do mundo? 
Enfim, o grande problema da matéria foi exaltar características que tenho absoluta certeza de que não refletem tudo que Marcela é, e ainda assim colocar como se fossem as de uma mulher ideal. Como se fossem os ~atributos~ que mulheres precisam ter para conseguirem um bom casamento. É absurdo utilizar de argumentos rasos para falar em um tipo de mulher ideal (ideal pra quê? ideal pra quem?) pra fazer com que um homem seja considerado de sorte por "tê-la". 

              Somos mais do que isso. Sejam as mulheres do lar - que têm muito mais nuances - sejam aquelas que não podem se dar ao luxo de não trabalhar pra não faltar comida  na mesa, as grandes empresárias, advogadas, magistradas, professoras, engenheiras..independente de tudo, todos os dias são de luta para nós. Muita luta.

             Claro que surgiu gente pra falar de um tudo. De inveja a "feministas dizem que lutam pelas mulheres mas não respeitam suas escolhas". Não sei até que ponto é burrice ou desonestidade intelectual. Repetirei aqui, com outras palavras, o que acabei de mencionar lá em cima, só pra que não restem dúvidas: atacamos a forma como a Veja retratou Marcela Temer, completamente rasa, e como ela exaltou essa forma (que provavelmente não reflete a realidade por completo). Mais, atacamos a forma como a reviosta colocou as mulheres no mundo, separando-as em mulheres ideais e não-ideais. As ideiais seriam as belas, recatadas e do lar. A maioria de nós não é bela (nos padrões de beleza racistas vigentes na sociedade), muito menos recatada e do lar e nem por isso temos menos valor do que as que são assim. Nosso valor vem da nossa condição de humanas. Somos seres humanos e isso basta para que mereçamos respeito.
O que isso tem a ver com o machismo sofrido pela presidenta? Tudo. Para a Veja e seus leitores, mulheres "do lar" ganham prêmios: um velho rico pra casar. Agora se você chega no poder, se você, mulher, sai do lugar que eles acreditam que você pertence: o lar, lugar de subserviência, merece apenas o desprezo da sociedade.